Resolução GR-086/2020, de 07/08/2020


Reitor: Marcelo Knobel

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Define Regras e Procedimentos para Prevenção e Acolhimento de Queixas de violência baseada em gênero e sexo na Unicamp.

O Reitor da Universidade Estadual de Campinas no uso de suas atribuições legais e estatutárias, 
CONSIDERANDO, para os fins previstos nesta Resolução, a necessidade de definir regras e procedimentos para prevenir violência baseada em gênero e sexo e para acolher e encaminhar queixas relacionadas a esse tipo de casos.

CONSIDERANDO a Lei no. 10.224, de 15 de 2001, e a redação dada pela Lei no. 12.015, de 2009, que alteram o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal que define os temas em questão.

CONSIDERANDO as definições propostas pelo Glossary on Sexual Exploitation and Abuse da Organização das Nações Unidas (2017), pelo World Report on Violence and Health, da Organização Mundial de Saúde, 2014), assim como pelas Leis no. 12.015, de 2009; 13.718/18, de 25/9/2018 e por jurisprudências do STF (AgRg REsp n. 1.154.806/RS, Rel. Ministro, Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 21/3/2012; AgRg no Resp 1359608/MG, Rel. Ministra Assusse Magalhães, Sexta Turma, julgado em 19/11/2013, DJe 16/12/2013, adota-se, para os fins previstos nessa resolução, as definições a seguir.

I – Violência baseada em gênero e sexo: qualquer ato de natureza sexual ou ato dirigido à sexualidade da pessoa, à sua identidade ou expressão de gênero, de natureza física ou psicológica, que tenha sido cometido, ameaçado ou tentado contra uma pessoa sem o consentimento dessa pessoa, incluindo os seguintes casos.

(a) – Assédio Sexual: emissão de comentários, conduta, exposição indecente, voyeurismo ou perseguição vexatórios relacionados com sexo, gênero, orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero de uma pessoa, sabendo-se ou sendo razoável supor que seriam indesejáveis. Inclui também (i) publicação, distribuição, transmissão, venda, disponibilização ou divulgação de imagem que implique a sexualidade de uma pessoa sem obter o consentimento da pessoa que aparece na imagem; (ii) todo ato de constranger alguém, com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. São considerados casos de Assédio Sexual Cibernético os casos conduzidos inteiramente ou em parte por meio eletrônico, como e-mail, postagens na web, mensagens de texto, e outras formas de atividade eletrônica.
(b) – Estupro: ato de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. Pode variar de ameaça de contato sexual sem consentimento até relação sexual forçada. Pode envolver situações em que a atividade sexual é obtida por alguém que abuse de uma posição de confiança, poder ou autoridade.

II – Consentimento: concordância em se engajar em atividade de natureza sexual dada, de forma clara, consciente e voluntária. Silêncio, assim como ausência de protesto ou de resistência não constituem consentimento por si só. A existência de um namoro ou o engajamento anterior em práticas de natureza sexual entre as pessoas envolvidas não pode nunca ser por si só tomados como indicador de consentimento. Consentimento pode ser revogado a qualquer momento. Consentimento não pode ser dado quando a pessoa é incapaz de concordar com a atividade como, por exemplo, quando a pessoa está incapacitada por uso de álcool ou drogas, quando está inconsciente, ou quando a atividade de natureza sexual foi induzida por uma conduta que constitui abuso de uma relação de confiança, poder ou autoridade. É responsabilidade de cada um dos envolvidos garantir que obteve o consentimento do outro. 
III – Membro da Universidade: para os fins previstos nessa resolução, são todos os indivíduos que tenham um registro na Unicamp, quer seja identidade funcional ou registro acadêmico, temporário ou não, incluídos neste conceito voluntários, empregados de empresas terceirizadas, funcionários da FUNCAMP, membros de equipes de pesquisa, pacientes, acompanhantes e prestadores de serviço e permissionários dos pontos comerciais da Universidade. 
IV – Queixoso(a): membro da universidade que relata ou denuncia um episódio de Violência Sexual em que figura como vítima. 
V – Inquirido(a): membro da universidade indicado como agressor(a) em queixa ou denúncia de violência sexual. 

RESOLVE 

Artigo. 1º - Ficam instituídas as regras e procedimentos a serem adotados pela UNICAMP em casos de violência sexual ocorridos no âmbito da Universidade Estadual de Campinas.

Artigo 2º - A Unicamp oferecerá a todos os Membros da Universidade apoio e orientações apropriados em situações de Violência Sexual. 

§ 1º - Serão dados apoio e orientação aos membros da universidade que se identificarem como vítimas em algum episódio de violência sexual.

§ 2º - Serão dados apoio e orientação aos membros da universidade que forem indicados como agressores(as) em algum episódio de Violência Sexual, garantindo-se o contraditório e ampla defesa, evitando-se pré-julgamentos, exposição ou outras consequências negativas antes que os fatos sejam apurados. 

§ 3º - A Universidade responderá do modo mais claro e rápido possível às queixas encaminhadas por membros da mesma que tenham sido afetados por um episódio de violência sexual. 

§ 4º -  Os apoios e serviços a serem disponibilizados envolvem os seguintes órgãos, embora não estejam limitados a eles: Secretaria de Vivência nos Campi (SVC), Hospital de Clínicas da Unicamp (HC), Ambulatório de Atendimento Especial do CAISM, Centro de Saúde da Comunidade (CECOM), Serviço de Assistência Psicológica e Psiquiátrica aos Estudantes da Unicamp (SAPPE), Diretoria Acadêmica (DAC), Diretoria Geral de Recursos Humanos (DGRH), Grupo de Apoio Psicopedagógico ao Estudante de Medicina e Fonoaudiologia (GRAPEME), Serviço de Apoio ao Estudante (SAE), Coordenações de Graduação, Coordenações de Pós-Graduação, Direções de Unidades, Ouvidoria da Universidade. 

Artigo 3º - Ficam estabelecidos os seguintes procedimentos para acolhimento das queixas a que se refere esta Resolução. 

I - O Serviço de Atenção à Violência Sexual (SAVS) é o serviço de referência para que o membro da universidade afetado por um episódio de violência sexual possa receber orientação e apoio referentes à sua saúde física e mental, incluindo aqueles referentes a suas atividades acadêmicas, de trabalho e/ou outras. 
II - Todo membro da universidade que receber um relato de violência sexual ou que testemunhar um episódio de violência sexual deve informar o(a) queixoso(a) sobre a existência do SAVS, assim como sobre os meios de entrar em contato com este serviço para obter informações e orientações.
III - Todo membro da universidade que testemunhar um episódio de violência sexual em que a integridade física da vítima esteja em risco deve acionar o serviço de emergência da SVC, que desencadeará o atendimento apropriado.
IV - Todo membro da universidade que testemunhar um estupro deve acionar o serviço de emergência da SVC, que desencadeará o atendimento apropriado ou conduzir a vítima diretamente ao Ambulatório de Atendimento Especial do CAISM ou ao Pronto Atendimento do HC, o que for mais apropriado.
V - Nos casos em que o primeiro acolhimento for realizado pela SVC, pelo CAISM ou pelo HC, esses órgãos devem comunicar o caso ao SAVS o mais rápido possível. Após o acolhimento inicial, o acompanhamento dos casos será feito pelo SAVS.
VI - Membros da universidade que recebam um relato de Violência Sexual podem transmitir este relato ao SAVS, assim como o nome e a informação de contato do(s) indivíduo(s) que figura(m) como vítima em tal relato, desde que obtenha seu consentimento prévio, para possibilitar a disponibilização de apoio, orientações e serviços. 

Artigo 4º - Ao receber uma queixa relacionada a um episódio de violência sexual, o SAVS deve tomar as providências necessárias para iniciar uma conversa preliminar com o(a) queixoso(a) o mais rápido possível. 

§ 1º - A partir desta conversa inicial, o SAVS providenciará assistência ao(à) queixoso(a), oferecendo informações sobre os serviços disponíveis e sobre as medidas cabíveis em cada caso, incluindo informações sobre possíveis medidas temporárias e adaptações acadêmicas e no trabalho que podem ser efetivadas para lidar com a situação imediata e garantir ao(à) queixoso(a) condições aceitáveis para dar continuidade a suas atividades na Unicamp. Conforme o caso, o queixoso será também orientado a procurar a autoridade policial.

§ 2º - O relato deverá ser documentado pelo SAVS e mantido em sigilo. 

§ 3º - O SAVS será responsável por coordenar a implementação de acomodações e medidas temporárias possíveis com celeridade. 

§ 4º - O SAVS pode, em bases confidenciais, consultar ou procurar assistência de outros serviços da Universidade para orientação e pode consultar ou pedir auxílio a serviços externos relevantes para o episódio particular que está sendo denunciado. 

Artigo 5º - Mediante coordenação do SAVS, as opções que podem ser disponibilizadas para o(a) queixoso(a) após um relato de violência sexual incluem, mas não estão limitadas às listadas a seguir.

I - Indicação de serviços ou recursos disponíveis dentro da Universidade e no município. 
II - Verificação, junto aos órgãos competentes, das possibilidades de adaptação de atividades acadêmicas ou de trabalho, assim como outras medidas temporárias, e sua implementação, sob coordenação do SAVS, em acordo com os órgãos envolvidos, que podem ser, entre outros, as coordenações de graduação e pós-graduação, as direções de unidades, a Diretoria Acadêmica e a Diretoria Geral de Recursos Humanos. 
III - Mediante desejo expressamente manifestado por escrito pelo(a) queixoso(a), o SAVS deverá tomar as providências necessárias para solicitar à autoridade competente a instauração de sindicância ou abertura de processo administrativo disciplinar contra o inquirido, quando este for servidor ativo ou discente regularmente matriculado na UNICAMP, encaminhando parecer e todos os documentos referentes à denúncia, que tramitarão em sigilo e nos termos das normas disciplinares vigentes.
IV - O queixoso será orientado a procurar a autoridade policial, conforme o caso, podendo apresentar denúncia simultaneamente na Universidade.

§ 1º - Os membros da Universidade que forem afetados por um episódio de violência sexual poderão não solicitar a apuração dos fatos, hipótese em que a Universidade somente poderá oferecer apoio, acomodações e medidas temporárias limitadas aos(às) queixosos(as). 

§ 2º - A Universidade tomará medidas adequadas para proteger de retaliação os(as) queixosos(as) e outros(as) que participem de processos referentes a queixas de violência sexual. 

§ 3º - O(a) queixoso(a) será informado sobre a conclusão da sindicância ou processo administrativo disciplinar ao qual deu início, sendo que, no caso de não instauração dos mesmos por decisão fundamentada, terá direito à apresentação de pedido de reconsideração, no prazo de 15 dias, a contar de sua ciência.

Artigo 6º - Os integrantes do SAVS e os demais servidores que participarem tanto do processo de acolhimento, quanto do eventual processo de apuração para apuração de episódios de violência sexual deverão guardar o necessário sigilo de informações. 

§ 1º - O compartilhamento de informações, com a expressa autorização do(a) queixoso(a), ficará restrito àquelas pessoas cuja participação seja estritamente necessária para a adoção das medidas previstas nesta resolução, que, igualmente, terão o dever de manter o sigilo preconizado no caput deste artigo. 

§ 2º - Para garantir o sigilo de informações, a tramitação de eventuais processos de apuração em papel deve ser realizada de forma restrita.

§ 3º - Para garantir transparência e prestar contas à comunidade, dados agregados sobre número de queixas recebidas, número de queixas que levaram a denúncias, número de denúncias que geraram processos administrativos disciplinares ou sindicâncias contra servidores e discentes, dessas, quantas concluíram pelo cometimento de infração disciplinar que levaram à punição, assim como o número e tipo de punições eventualmente efetivadas devem estar disponíveis no site do SAVS, garantindo-se sempre o sigilo com relação à identidade de queixosos(as) e de inquiridos(as) nos termos definidos por esta Resolução.

Artigo 7º - As queixas apresentadas contra membros da Universidade que não sejam servidores ativos ou discentes regularmente matriculados ensejarão a adoção das medidas cabíveis, conforme o caso, sem prejuízo do apoio ao queixoso (a).

Artigo 8º - Ao (À) queixoso (a) será solicitado repetir seu relato o mínimo de vezes necessário para a adoção das medidas previstas nesta Resolução.

Artigo 9º - A Comissão Assessora da Política de Combate à Discriminação Baseada em Gênero e/ou Sexualidade e à Violência Sexual coordenará o desenvolvimento de ações de educação, formação e conscientização dirigidas aos membros da Universidade com o objetivo de prevenir violência sexual e disseminar os valores institucionais da equidade, da inclusão e do respeito.

Artigo 10º - Essa Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as disposições em contrário. 

Disposições Transitórias 

Artigo 11º - Esta Resolução será revista a cada três anos, sendo atualizada sempre que se fizer necessário, visando a adoção dos métodos mais adequados de enfrentamento da violência baseada em sexo e gênero, a partir de discussões coordenadas pela Comissão Assessora da Política de Combate à Discriminação Baseada em Gênero e/ou Sexualidade e à Violência Sexual com os membros da Universidade, em especial com os discentes, docentes e servidores.


Publicada no D.O.E. em 07/08/2020.